para Jô M e Sara F
I
Não costumo revelar o voto, mas creio que esta campanha,
pelos seus lances contraditórios e até trágicos, como a morte do Eduardo Campos,
sugere essa revelação. Como a maioria dos meus colegas professores, também desejo que o
Brasil mude, e aprendo com alguns descrentes, eternamente à
esquerda, como, às vezes, parece mais fácil ser “do contra”; principalmente quando este “contra”
é pré-estabelecido a partir do lugar privilegiado de onde falamos.
Segundo O Globo de hoje, a proposta
educacional do Aécio destaca duas prioridades: a criação do “Pró-Médio, similar
ao Pró-Uni”, e a concessão “de bolsas de estudos para alunos carentes estudarem
em escolas privadas”. Para quem atua no
universo educacional, este fragmento acima diz muito. Pelo menos três coisas
chamam atenção: primeiro, o nome do programa a ser
criado. Segundo, a presença do verbo “concedendo” – forma do gerúndio utilizado pelo jornal;
e terceiro, a assunção da escola privada como lugar privilegiado do saber.
Para quem lida com instrumentos verbais como as línguas,
linguagens, memórias e ficções, é possível associar Pró-Médio a determinada classe social?
Na cabeça deste professor nascido no Nordeste, e que passou a vida como estudante
e professor de escolas, interantos e universidades públicas, a sigla Pró-Uni sugere um roteiro inclusivo diferente de
Pró-Médio. Mas, deixemos de lado os nomes dos programas e o verbo "conceder" utilizado pelo referido jornal.
II
Passemos ao terceiro ponto deste roteiro educacional –
a escola privada. Sabemos da sua eficácia. Sabemos também dos seus custos infindos.
No Rio de Janeiro, as cobranças nas escolas privadas ultrapassam os
valores da inflação; o que resultou, segundo a SEC, na migração de quase 30 por
cento dos alunos cariocas para escolas da rede pública. Isso se dá atualmente, mesmo o governo federal não incentivando a escola privada; imaginem o contrário.
Eleger a escola privada como espaço privilegiado do
saber é um bom roteiro; mas demora, requer prazos. Requer estrutura básica. Antes de privatizar o ensino, são necessários investimentos
na formação intelectual e científica, e uma melhor distribuição de bens e serviços pós inclusão. Estamos falando de um país que nunca
ganhou um prêmio Nobel, em nenhuma área, e cujas universidades não
figuram em nenhum ranking global. Um país cuja população de analfabetos – cerca
de 13 milhões? – abrange praticamente um Chile inteiro.
Mas sem drama. Corta o drama na sacola, Ney. Falta o
Brasil resolver as suas pendências sociais. Um dado histórico e cultural nos dá idéia dessa necessidade de
educação: dos nosso 514 anos de história, 388 foram anos de
escravidão indígena e negra. Isso sem falar nos nossos holocaustos indígenas (havia
cerca de 6 milhões de índios quando os portugueses chegaram por aqui) e
sertanejos (milhares de homens e animais foram mortos em Canudos e nas
estiagens seculares), dentre outros. Que tipo de imaginários construimos a partir destes gestos?
Quase quatro séculos de escravidão geram hábitos que não se esquecem da noite para o dia. Após as catástrofes, as identidades e costumes precisam ser relidos, refeitos. Temos apenas 126 anos no exercício da liberdade. Perante a história, estes 126 anos de abolição e cultura nos situam numa espécie de infância social. E como
infantes, necessitamos aprender o discurso, nos educar. Precisamos de roteiros que erijam, sugiram limites. Leis que proíbam o racismo,
a discriminação e a homofobia, dentro outros gestos violentos, já que ninguém nasce lindo, e a civilidade, a cidadania são aprendizados, conquistas.
Atuo no espaço do magistério e da extensão rural há mais
de três décadas. Lecionei nos ensinos fundamental e médio, e atualmente sou
professor universitário. Amo lecionar. Conheço alguns dos principais problemas educacionais
do Brasil, e sei que o governo Dilma está longe da perfeição. Muito precisa ser
feito, mas quero registrar três programas que se desenvolvem ao meu redor, e dos
quais posso testemunhar de forma afirmativa: PRO-UNI, PARFOR e PIBID (quero
deixar claro que não coordeno nenhum destes programas).
Isso sem falar no PLI - Programa de Licenciaturas Internacionais. Criado por Dilma, este programa beneficia estudantes de graduação, em universidades estrangeiras, e posso aferir os seus bons resultados já que alguns destes alunos são meus orientandos. Entrei para a universidade pública nos anos 80, no final da ditadura militar. A minha formação e atuação acadêmicas conincidem com os governos Sarney, Collor, Itamar, FHC, Lula e Dilma, e este exercício comparativo me orienta.
Os programas implantados por Dilma geram contradições produtivas. Tenho, por exemplo, alguns alunos fluminenses que, embora desconheçam o centro do Rio de Janeiro, estão estudando em Coimbra ou Lisboa, há mais de um ano, com direitos a seguro saúde e moradia. Por essas e outras não dá para ser "do contra" nesta eleição.
Os programas implantados por Dilma geram contradições produtivas. Tenho, por exemplo, alguns alunos fluminenses que, embora desconheçam o centro do Rio de Janeiro, estão estudando em Coimbra ou Lisboa, há mais de um ano, com direitos a seguro saúde e moradia. Por essas e outras não dá para ser "do contra" nesta eleição.
P. S. Não sou filiado ao PT, nem a qualquer outro partido político..
7 comentários:
O Brasil tem 126 anos de "exercício da liberdade"? Não entendi. É mais ou menos consensual (para usar um adjetivo discreto) que a Independência do Brasil ocorreu em 1822... Você considera a Proclamação da República (hoje sabidamente um golpe militar, o primeiro que foi encenado nesse país) o início do "exercício da liberdade"...? Meio incongruente, não lhe parece?
Caro Anônimo
O "exercício da liberdade" ao qual me refiro tem a ver com o
tempo da abolição dos escravos
que ocorreu em 1888, há exatos
126 anos, ok?
Boa Tarde!
O povo infelizmente sofre por que lhe falta conhecimento, e por causa disso, o próprio povo é usado como massa de manobra por aqueles que detêm o "saber", afinal quem tem o conhecimento ( o saber) tem o poder, isso é, se souber como usá-lo. Então poderá mais, quem souber usar mais o que sabe.Na política da vida só os sábios prevalecem!
Um forte abraço!
Cátia Braga
"Mas sem drama. Corta o drama na sacola, Ney. Falta o Brasil resolver as suas pendências sociais."
Neste domingo vamos ver o que o Brasil quer.
bj
L H
Cátia, LH e anônimos,
Agradeço pelas visitas ao blog, aguardo comentários após as urnas neste domingo.
Abraços
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