Ele
é o cara que, segundo Roland Barthes, abriu o signo. Essa abertura desequilibrou, no século passado, as
estruturas culturais de Paris dos anos 60. Produziu polêmicas. Provocou abalo e rasura nos discursos
e nos escritos da filosofia e demais disciplinas das ciências humanas. No texto e na vida, Derrida dilatou a
sintaxe e os conceitos da metafísica. Interagiu com a literatura, a psicanálise
e o marxismo, dentre outras áreas, nomeando os territórios da diferença, operando a desconstrução, intervindo.
Quase
uma década após a sua morte, o filósofo e escritor Jacques Derrida (1930–2004)
ganha a sua primeira biografia. Escrito pelo crítico e escritor francês Benoit
Peeters, o livro foi lançado este mês, no Brasil, pela editora Civilização
Brasileira. Com prefácio e revisão técnica de Evando Nascimento – aluno e tradutor do filósofo
nascido na Argélia –, o volume com mais de 700 páginas é dividido em três
partes: “Jackie”, “Derrida” e “Jacques Derrida”.
A
parte I – “Jackie” – é dedicada aos anos da juventude e da formação do futuro autor
de A escritura e a diferença, texto
que “constitui talvez”, segundo o biógrafo, “o ato fundador do que logo virá a
se chamar os “cultural studies” - os combativos estudos culturais. A parte II – “Derrida” – como o próprio título
anuncia, registra a inscrição deste nome no universo acadêmico, e o
desenvolvimento da obra filosófica do autor. Esse registro nominal leva em
conta as leituras, os seminários, os escritos, as publicações do autor; ressalta suas filiações estéticas
e institucionais, registra escolhas afetivas e atitudes políticas.
“Jacques Derrida” – a última parte – trata dos
desdobramentos da obra e da sua celebração, ressaltando as posturas éticas e
filiações sociais e políticas. São as travessias urabnas do autor pelos territórios - verbais, imagéticos - da desconstrução. Mas nem tudo tem a ver apenas com o homem que detonou a "clausura logocêntrica" e denunciou a existência do "significado transcendental". O alentado volume expõe também temas e episódios
delicados como a depressão, o câncer e a prisão montada, em Praga, por porte de droga; além de um
terceiro filho nascido da relação extraconjugal com a filósofa Sylviane
Agacinsky.
Biografia entremeada de cartas, fotos, textos inéditos e depoimentos
pessoais, o livro de Benoit é bastante informativo e confessional, além de bem
escrito. Em algumas passagens, o seu texto ganha tons romanescos, sugerindo, na velocidade da ação narrativa, os desvios da paixão na - e pela - vida narrada. Tudo isso torna prazerosa e produtiva a sua leitura, e aviva os rastros e a "letra" do seu
personagem - o cara que abriu o signo linguístico, e a quem Barthes agradeceu em vida.
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