O texto a seguir é sobre o livro Muro/deriva, do poeta e professor Eli Celso, publicado em 2014 pela editora Sol Negro, de Natal.
o mapa a lição
Myriam Coeli
Neste Muro pode ser lido um mapa
que arremessa, desloca, leciona uma rota. Uma declaração de afeto ao
espaço, onde veredas imagéticas e trilhas sonoras mais sugerem e seduzem do que
comunicam ou consolam. Lida na concretude do muro ou nas folhas da floresta, esta “Tábua dos
contentes” afete a carne de quem lê. Arremessa o leitor ao deserto.
Pode deslocá-lo ao sertão de si, assim: “Tu és um mapa, e eu, fuzil”.
Irrigado com sangue e outros líquidos
de diferentes países, este mapa é atravessado por pegadas de multifacetados eus.
Sem aura nem acostamento, alguns deles carregam em seus rastros um lirismo irônico,
às vezes violento, sem abrir mão da audição dos seus mortos. Outros recitam o próprio
Livro dos mortos. Outros eus celebram uma escrita nutrida por diferentes
figurações da morte e suas visitas cotidianas. Outros, mais chegados ao
universo mí(s)tico, não descartam alguns mitos bastante relidos e rentáveis,
como Judas e Medusa – a visão das moedas ou as moedas da visão: a dor de
saber-se arma e ler, na impossibilidade do olhar, a própria vítima.
O mapa arma “asas em casco”. Fala a
língua da mãe e do pé. Em alguns
trechos, sugere outros tons – de corneta, flauta e “máquina de sofrer” –, a fim
de imitar a canção distante. Em seus caminhos e em suas colheitas, os trajetos
deste mapa contêm muito dos quatro elementos. Principalmente da água e do ar. Mas,
apesar dos discursos hídricos e eólicos que favorecem as derivas do ser, o que se
colhe neste muro são as “primazias/ de flores, graças, vinhos e frutos/ paridos do ventre
Terra”. É ela quem acolhe o fogo que se estende pela “planície.../... os trens/
e suas linhas...”