e todo caminho deu no mar

e todo caminho deu no mar
"lâmpada para os meus pés é a tua palavra"
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domingo, 7 de abril de 2013

Dona Dora



Quando fazia o monólogo Dona Doida, guiada pela poesia da mineira Adélia Prado, sua conterrânea, a atriz Fernanda Montengro me deu, no seu camarim em Natal, um dos autógrafos mais belos da minha vida: “Coragem! Porque sonho não morre.” Além da idéia de afirmação condensada, gosto principalmente da sintaxe luxuosa desta frase borgeana no seu jeito de pontuar e sugerir. Esse autógrafo-verso passou a ser uma espécie de mantra existencial escrito por quem acredita que a arte, dentre outras coisas, erige, conforta.

 
Sou atento a toda aparição da Fernandona. Ela sempre alumia. Acrescenta porque surpreende. Não se repete. Além de iluminar teatros e telas de cinema há mais de meio século, ela vitaliza páginas de jornais e telas de TV em entrevistas permeadas de lucidez e poesia, como a que deu esta semana para o ator Lázaro Ramos, no Canal Brasil, rememorando os seus primeiros trabalhos: “ouço a rádio como se fosse tatuagem”.


Essa voz é tatuada em fãs bem mais interessantes do que eu, como a sueca Liv Ullmann. A Atriz predileta de Bergman declarou recentemente o seu apreço por Dora do filme Central do Brasil, personagem com a qual Fernanda concorreu ao Oscar de melhor atriz em 1999.

 
Marcou-me neste 2013 uma entrevista que a atriz deu para O Globo, falando da sua arte e reconhecendo, sem dramas, as perdas impostas pelo tempo. Vi esta matéria afixada até em restaurante. Sou sempre atento às lições da Fernandona. Elas são didáticas, permeadas de um grau de gentileza difícil de encontrar nos meios culturais, como esta lição de alteridade: “Uma platéia talentosa é responsável por grande parte do espetáculo”.

 
Numa tempo de novelas que não salvam, e enquanto não chega "Saramandaia" - o próximo trabalho de Fernanda, (a)guardemos suas lições de sabedoria. Ao afirmar a existência com profissionalismo e vigor, ela ajuda a construir a platéia, o país. Deve ser por isso que, nos anos 80, Dona Fernanda Doida Dora Montenegro de Beauvoir foi convidada para ser ministra da Educação e Cultura. Sábia, ela recusou o convite. Lembrou-me um personagem de Terra em Transe, do Glauber Rocha, que dizia serem a a poesia e a política demais para um homem só.
 
 
 

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

2 poetas concretos



a vida é curva

Oscar Niemryer
arquiteto carioca e senhor das curvas, dizia ser a vida mais importante que a arquitetura

1907 - 2012



não finge o pasmo, não inventa que é chapado:
quem pira além da piração não é pirado.

Décio Pignatari
escritor paulista e senhor "cloaca", para quem a literatura parecia ser mais importante que a vida


1927 - 2012



sexta-feira, 24 de agosto de 2012

o poeta de "todas as cidades que existem"



Cicero, comecemos pelo título. Por que um advérbio?

AC: Por que não? “Guardar” é um verbo. Mas quem melhor explica esse título é Antonio Carlos Secchin, na orelha do livro. Ele diz: “O advérbio ‘porventura’, afirma-nos o Houaiss, é empregado especialmente em perguntas delicadas. Já o sentido de ‘ventura’ oscila entre ‘felicidade’ e ‘risco’ – dois combustíveis perpétuos do poema”.


“Que não se engane ninguém: / ser um poeta é uma África.” (“O poeta marginal”). O que sugere ao leitor a conclusão desse eu poético?

AC: Já que o Secchin citou o Houaiss, vou citar o Aurélio, para o qual “áfrica” é “façanha, proeza, feito”. Assim, ser um poeta é uma façanha, uma proeza, um feito. Usa-se com minúscula, mas prefiro com maiúscula, quando a façanha fica ainda maior e mais misteriosa, como o continente negro.


Tem nome ou referente a “Cidade” que você constrói para Arthur Nestrovsky?

AC: Não. A cidade de A cidade e os livros é o Rio de Janeiro, mas seus lugares “abriam-se em esquinas infinitas / de ruas doravante prolongáveis / por todas as cidades que existiam”. A cidade de Porventura é a que se compõe de todas as cidades que existem. O poema é dedicado ao Arthur Nestrovsky porque surgiu quando ele me encomendou um poema para publicar, não me lembro mais em que periódico.

 
Um “entregador de flores” rouba a cena no poema “As flores da cidade” (Porventura). Há garotos em canções e poemas como “Onda” (Guardar) e “Vitrine” (A cidade e os livros). Gostaria que comentasse a presença deles na sua poética, e de saber se existe sintonia entre essas “musas” e o eu poético que se ouve no “Balanço”, suspeitando se será “plenamente adulto”.
 
AC: Do meu ponto de vista, não há grande sintonia entre eles. É que o sujeito que jamais será plenamente adulto é o sujeito do poema, o poeta. De fato, como poderia ser considerado adulto, sério e maduro alguém como eu, que jamais seguiu carreira alguma, que não tem profissão, emprego ou aposentadoria, alguém que, como diz Borges, “se aplicó a las simétricas porfias / del arte, que entreteje naderías”? A entreter naderias, envelheço, mas jamais cheguei ou chegarei a ser maduro ou adulto. É isso que, entre outras coisas, penso estar dizendo ali.

Já o garoto de “Onda” se origina no Hino Homérico a Hermes. Hermes é o mensageiro dos deuses, correspondente a Mercúrio ou Exu. O autor do Hino fala dele como

[...]

um garoto versátil, manhoso,

ladrão, boiadeiro, pastor de sonhos, olheiro

da noite, manjador de portões, que logo mais

brilharia por seus feitos entre os mortais.

[...]

Transplantando o cenário, da Arcádia para o Arpoador, e modificando um tanto esse trecho do poema, escrevi:

[...]

Garoto versátil, gostoso,

Ladrão, desencaminhador

De sonhos, ninfas e rapsodos

[...]

“a flor/ da onda” vem de Alcman (fr.26).

“Vitrine”, por outro lado, é produto da percepção do comportamento e da divagação sobre o narcisismo e sobre os sonhos de consumo e de virtuosismo futebolístico de tantos rapazes brasileiros.

Quanto a “Flores da cidade”, trata-se de um poema que foi feito a partir de minha experiência de caminhar pela cidade. Adoro tais caminhadas, durante as quais observo muitas coisas, algumas terríveis, outras belas, e às vezes troco olhares ambíguos, equívocos, polissêmicos com os rapazes bonitos que atravessam o meu caminho.

 
Desde Guardar, você vem atualizando a memória e o imaginário urbanos, através de um profícuo diálogo com a mitologia e com alguns autores representativos da cultura clássica. Qual é a importância desse diálogo para a poesia contemporânea?

AC: Posso falar somente da importância desse diálogo para a minha poesia. O que ocorre é que penso em toda a poesia canônica, principalmente na poesia do mundo clássico, que pertence tanto ao Brasil quanto a qualquer outro país, como um thesaurus, um tesauro, um reservatório de figuras. O poeta romântico inglês Keats dizia, com razão, que o poeta não tem personalidade, pois é um camaleão. Pode-se dizer que, enquanto poeta, ele não tem um ser particular. Homero era retratado – a partir, é claro, do retrato que ele mesmo fez do poeta Demódoco, como cego. Interpreta-se isso como a significar que o que ele canta não vem de sua própria experiência, mas do sopro das Musas. Mas a cegueira quer dizer também que ele não se limita ao que vê: não se limita ao presente. Assim é todo poeta enquanto poeta. Por isso, digo em “O poeta cego”:


Eis o poeta cego.
Abandonou-o seu ego.
Abandonou-o seu ser.
Sem ser nem ver ele verseja.

[...]

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Entrevista a Lohan Lage



Olá, caro Nonato. É com muita satisfação que o recebemos, mais uma vez como jurado, no Concurso de Poesia Autores S/A. Nonato, como você enxerga a literatura contemporânea brasileira, diante de tantas mudanças nos hábitos da leitura e da escrita, bem como da edição dos livros e da divulgação dos trabalhos pelas diversas mídias disponíveis? Qual é a cara do novo poeta brasileiro? Ele preza pela técnica, ele remete ao clássico, ou ele possui raízes firmes no movimento modernista da década de 20/30, quebrando paradigmas a seu modo?


NG: Agradeço pelo convite, Lohan.  Parabenizo pelo concurso cuja continuidade deve ser celebrada, e pela sugestão da mitologia como um tema repleto de possibilidades. Parabéns principalmente para os autores classificados. Creio que a qualidade cresceu. 


Vamos à pergunta que, na verdade, são três ou quatro. Quando penso em literatura contemporânea, falo principalmente do que foi produzido nas letras das últimas décadas do século XX e neste início de milênio. Na minha visão de leitor, essa produção tem pouco a ver com o que chamamos, por exemplo, de Literatura no século XIX – o mais literário de todos os séculos. Naquele contexto, a Literatura era feita basicamente do diálogo com a própria Literatura – uma arte calcada principalmente nas noções de gênero e oralidade que sedimentam a cultura clássica. Depois das vanguardas do início do século XX e de toda arte de ruptura produzida pelo Modernismo, ninguém acredita mais nisso.


O cotidiano do século XX produziu uma sensibilidade maquínica e virtual onde os conceitos de tempo, espaço e identidade são relidos, alterando as concepções artísticas do Classicismo e do Romantismo.  A lição de Walter Benjamin nos ensina que quando mudam os meios de percepção de uma comunidade, transformam-se suas formas de fazer arte, de produzir cultura. Ou seja: não dá para viver no século XXI cercado de mídias, telas, teclas, Iphones e escrever como se estivesse num campo árcade tocando flauta, ouvindo vento, sem IPTU para pagar. Por isso creio que a cara do poeta contemporâneo seja a do sujeito que, dialogando criticamente com o arquivo de formas que a tradição nos legou, consegue inscrever a sensibilidade do seu tempo.


2.Independente do estilo dessa nova geração literária, quero saber, na sua concepção, o que um poema tem que ter/ser para receber a sua nota 10? Que técnica é imprescindível, a seu ver? A teoria deve sobrepujar a subjetividade na produção de um poema?

NG: Teoria é um instrumento contextual e produtivo que serve principalmente para dar aula. A poeta contemporânea Ana Cristina Cesar escreveu que foi salva pela técnica. Quando pensamos em arte, não há salvação sem técnica. Seja na vida ou no texto, é preciso o exercício de uma forma. Além da imagem, a forma remete a sons, noções de sintaxe e de extensão. Os materiais acústicos da forma têm a ver com ritmos e timbres, dentre outros, demarcando uma voz, um jeito de dizer. Por isso não curto poeta que não lê ou aprimora esse jeito. Independente de geração, a nota máxima vai geralmente para o autor que acentua a sua voz. E essa acentuação vocal requer, hoje, um diálogo com diferentes linguagens – verbais e não-verbais – e um domínio da forma que leva em conta, dentre outros, as noções de rapidez, visibilidade e fragmentação.

Esta entrevista completa e os meus comentários sobre os poemas do referido concurso foram publicados em http://autoressa.blogspot.com.br/



quinta-feira, 29 de março de 2012

Floração da Prosa no Sertão

Gurgel, Nonato. Mediação e leituras literárias do Brasil. Cursos da Casa da Leitura. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, 2010.


I – A Prosa Sertaneja do Brasil no Século XX


Mas o lindo pra mim é céu cinzento
Com clarão entoando o seu refrão
Prenúncio que vem trazendo a lenda
A chegada da chuva no sertão...

(“Festa”, Gonzaguinha)



             Com ou sem chuvas, na festa ou na guerra, o sertão é uma presença antiga e bastante entoada na nossa cultura. Seja na Música Popular Brasileira, como demonstra o trecho da canção acima, seja nas outras artes ou na historiografia da Literatura Brasileira, o sertão é um tema e “personagem” bastante produtivo.


             O sertão inspira. O sertão transpira. Gera. Desde a nossa colonização até o atual contexto histórico globalizado, o sertão constitui-se num espaço social e numa metáfora estética da cultura e da arte brasileira. Esse espaço e essa metáfora projetam uma face muito produtiva da nossa identidade cultural, como leremos a seguir.



          Das cartas da colonização do Brasil, escritas no século XVI, passando pelo romance fundado no Romantismo do século XIX, o sertão perpassa vários textos. Destaca-se, principalmente, na prosa romanesca de José de Alencar, como podemos ler nas narrativas de cunho regionalista, e em romances como O Sertanejo (1887). Alencar tenta, com a forma do romance, mapear culturalmente o país. Em sua produção literária, o escritor e político cearense busca dar conta da vastidão estética e social do Brasil. José de Alencar busca a construção de uma identidade nacional, através da inscrição da forma romanesca. Nessa inscrição, o espaço sertanejo ganha uma visibilidade inusitada.



          Pelos textos de escritores considerados pré-modernistas, como Coelho Neto, o sertão envereda no século XX.  Ele é também título, espaço e “personagem” no livro Pelo Sertão (1889), de Afonso Arinos.  No romance Vida Ociosa, de Godofredo Rangel, e na produção literária de Hugo de Carvalho Ramos, dentre outros, o sertão é presença determinante. 


          O sertão é um espaço a partir do qual é possível ler, dentre outros problemas, a “complexidade do problema etnológico no Brasil”, como diz Euclides da Cunha no início de “O Homem”. Nesta segunda parte de Os Sertões este ensaio histórico com sintaxes romanescas, com desfecho digno de uma tragédia e altíssimo teor de poesia – o sertanejo Antonio Conselheiro surge como o beato que condensa em si muito da identidade dos milhares de fieis que o seguem pelas veredas do sertão baiano.


          Sertão e Modernismo têm tudo a ver. Na esteira do que caracteriza a nossa modernidade e sua busca de identificação com a realidade social e a cultura brasileira, o sertão é um dos espaços mais estetizados pelos poetas e ficcionistas do Modernismo que atravessa o século XX. Podemos dizer que o espaço sertanejo serve de cenário para a grande parte da Literatura Brasileira escrita no século XX. Ele serve de base para a escritura do espaço narrativo que sedimenta grande parte dos volumes que representam o nosso cânone moderno.  Isso desde a publicação de Os Sertões (1902), de Euclides da Cunha, até a publicação de romances como Nossa Terra (1976), de Antonio Torres, A Hora da Estrela (1977), de Clarice Lispector, e A Ressurreição de Antonio Conselheiro e a de seus 12 apóstolos (2007), de Moacir C. Lopes, dentre outros.


          Sabemos que, na literatura, as relações entre o espaço e a escrita possibilitam a produção e a leitura de múltiplas e diferentes formas estéticas. Essas relações entre espaço e texto possibilitam também a construção de linguagens as mais diversas.  Dependendo do gênero e da forma literários, seja no romance ou no conto, a noção de espaço sugere um tratamento diferenciado por parte de quem cria. Segundo o escritor e ensaísta argentino César Aira, no seu livro Pequeno Manual de Procedimentos, “... no conto, o cenário não tem tanta importância, a anedota podendo ir além. Já no romance o cenário cresce...”[1].



           Para César Aira, selecionar o espaço no qual o autor pretende inscrever a sua narrativa corresponde a resolver grande parte da equação de quem escreve. Acerca dessa problemática em torno do espaço narrativo, o escritor argentino assegura: “Encontrar um cenário onde situar a ficção é a metade (ou mais) do trabalho do narrador. A cena física estabelece a cena humana, e a coincidência das duas ocasiona a peripécia”[2]. 


          Com base nessa leitura do espaço narrativo, empreendida por Aira, destacamos a importância do espaço sertanejo e das suas figurações, principalmente nas narrativas escritas no Brasil moderno. Desde o período da nossa colonização, chegando ao século XX até este início de milênio, o sertão é uma presença marcante na cultura e na Literatura Brasileira. Exemplar dessa marca é um livro como Faca (2003), de Ronaldo Correia de Brito, um médico nascido no sertão de Inhamuns, no Ceará, e que demorou muitos anos lapidando os seus escritos. Em seus contos, esse autor cearense estetiza a terra sertaneja e seu imaginário religioso e bélico, em meio às nuanças da vida moderna. Sua marca diferencial está na ação de não descartar a raiz e o cotidiano sertanejos e o aparato moderno e tecnológico que nos circunda.



           De olho na raiz e na antena, o escritor Ronaldo Correia de Brito filia-se a uma família literária e sertaneja que possui em Euclides da Cunha um dos seus ícones mais representativos. Euclides é o grande intérprete da identidade cultural do Brasil. Na sua produção estética e literária, o sertão é lido como uma “... terra ignota, em que se aventura o rabisco de um rio problemático ou idealização de uma corda de serras.”[3]


          Além de Euclides, outro autor destaca-se como exímio intérprete da nossa identidade sertaneja: o sociólogo pernambucano Gilberto Freyre. No seu livro clássico Casa Grande & Senzala (1934), ele incorpora o cotidiano sertanejo na leitura que empreende da nossa colonização, além da problemática da miscigenação. O seu ensaio apresenta uma tonalidade poética, descrevendo da seguinte forma o espaço sertanejo e suas plantas: “... os nossos sertões ouriçados de mandacarus e xiquexiques. Descampados em que a vegetação parece uns enormes cacos de garrafas, de um verde duro, às vezes sinistro, espetados na areia seca.”[4]


          Esses “descampados” da “terra ignota” servem de cenário para uma gama de autores modernos cujas obras marcaram principalmente a literatura produzida no Brasil durante o século XX. Dentre estes autores, destacamos Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Rachel de Queiroz e José Américo de Almeida. Além desses escritores, dois grandes intérpretes da modernidade brasileira elegem o sertão como espaço de estetização das suas produções literárias: Guimarães Rosa e Clarice Lispector.


          Principalmente o sertão de Minas Gerais atravessa grande parte da narrativa inovadora e oralizante de Guimarães. Ele relê o espaço referencial sertanejo, criando um universo mítico e místico, no qual o sertão passa a ser o lugar onde o pasto carece de cerco. Um lugar onde limite não há. Já Clarice Lispector, no seu último romance, A Hora da Estrela (1977), estetiza a história de uma moça nascida no sertão de Alagoas e que, segundo o narrador, não teve floração. Para Rodrigo S. M. – a voz que narra –, a moça era capim. Sem florir, Macabéa vagava sem rumo pelo sertão até chegar ao Rio de Janeiro, onde acorda ouvindo os galos na Rua do Acre. Seja no universo rural ou urbano, ela vagava, na verdade, pelo deserto...



II –Deserto, Sertão



          Segundo o pesquisador e ensaísta pernambucano Gilberto Freyre, no livro póstumo De Menino a Homem (2010), as palavras sertão e deserto possuem extrema relação. Tratando da origem da palavra, Freyre diz que “Sertão era aumentativo de deserto”[5]. Essa assertiva remete às figurações de sertanejos que vivam em lugares distantes. Viviam longe da civilização. Pessoas que moravam no ermo. Pessoas “do sertão”, “de sertão”, daí o deserto – Desertão.


          O sertão está em toda parte – anuncia Riobaldo em Grande Sertão: veredas (1956), de Guimarães Rosa. O sertão é o mundo. No sertão do serrado brasileiro brota uma das anedotas políticas mais ricas em torno do nosso presidente JK. Conta-se que quando decidiu construir Brasília, Juscelino convidou as imprensas nacional e estrangeira para conhecerem o solo no qual seria erigida a futura capital do Brasil. Um mar do jornalistas e fotógrafos adentrou o serrado, atendendo ao convite do então presidente. Os profissionais da mídia cercavam Sua Excelência, quando uma jornalista francesa indagou a ele se não era um absurdo construir uma cidade em pleno deserto. Ao que Juscelino respondeu: “Absurdo, minha jovem, é o deserto”.


          O deserto é absurdo. O que fica claro nessa assertiva de JK é a necessidade que temos, como sujeitos modernos em constantes deslocamentos, de enfrentarmos o deserto e suas fronteiras. Fronteiras que também se deslocam. Fica claro nessa assertiva presidencial, o desejo de “amar” o “deserto e seus temores”[6].  Segundo Baudrillard, “a grandeza dos desertos consiste em que eles são, em sua aridez, em sua secura, o negativo da superfície terrestre e dos nossos humores civilizados. Lugar onde se rarefazem os humores e os fluidos...”


          Na anedota de JK, fica nítida a importância de lermos as figurações do deserto – os seus vazios, as suas faltas, as suas senhas e areias de superfícies. Os sinais do deserto. O deserto como origem e fim da travessia. O deserto, suas repetições. O deserto mais o cansaço da terra. O deserto e os homens. O nômade e sua travessia infinda pelo deserto e seus silêncios. “O silêncio do deserto também é visual”, diz Baudrillard. Sua leitura atenta para os planos silenciosos do deserto onde brotam a palavra e a imagem.


          Espaço plano de onde brotam imaginação e pensamento em travessias infindas, labirínticas, o deserto deseja ser lido. Lido como crítica e metáfora da cultura contemporânea. Essa leitura crítica e metafórica permite entendermos a nossa condição finita e vazia num mundo no qual as idéias de superfícies e deslocamento deletam os roteiros da profundidade e da fundamentação.



          O poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto é outro exímio leitor do homem do sertão e do deserto como metáfora espacial. Em seu livro Morte e Vida Severina (1955), o poeta batiza o espaço sertanejo onde o homem nasce, vive e morre entre solo, pedra e linguagem. O poeta relê a linguagem da pedra. Cabral estetiza a língua do pé e do pó. Ele sabe que “no idioma pedra se fala doloroso”[7]. Através dessa língua o poeta diz ser possível “cultivar o deserto/ como um pomar às avessas”. Esse cultivo é sugerido pelo eu lírico do livro Psicologia da Composição (1947), que tem início com a “Fábula de Anfion” dizendo do deserto e do vocabulário.


          De ouvido atento às linguagens sertanejas e sua oralidade, Cabral constrói a fala de quem habita aquelas paragens, assim dizendo em A Educação Pela Pedra (1965)[8]:


O sertanejo falando


1


A fala a nível do sertanejo engana:
as palavras dele vêm, como rebuçadas
(palavras confeito, pílula), na glace
de uma entonação lisa, de adocicada.
Enquanto que sob ela, dura e endurece
o caroço de pedra, a amêndoa pétrea,
dessa árvore pedrenta (o sertanejo)
incapaz de não se expressar em pedra.


2


Daí porque o sertanejo fala pouco:
as palavras de pedra ulceram a boca
e no idioma pedra se fala doloroso:
o natural desse idioma fala à força.
Daí também porque ele fala devagar:
tem de pegar as palavras com cuidado,
confeitá-las na língua, rebuçá-las;
pois toma tempo todo esse trabalho



          A “árvore pedrenta” cultivada no solo da poética cabralina deu muitos frutos. As pedras e os desertos estetizados por João Cabral são figurações estéticas e culturais do nosso tempo. Na poética contemporânea, o deserto e suas figurações continuam gerando linguagens e formas, possibilitando as mais diversas releituras. É o que assegura o poeta e escritor Macro Lucchesi, em seu livro Os Olhos do Deserto (2000). Diz o autor: “Minha busca do deserto foi e tem sido eminentemente poética, que tangencia claramente questões outras como as de ordem teológica, lingüística e política. ...O deserto é uma fábrica de metáforas”[9].


          Quem também se destaca como exímio leitor do deserto e do sertão é o escritor peruano Mário Vargas Llosa. Detentor do Prêmio Nobel de Literatura em 2010, o autor de A Guerra do Fim do Mundo (1985) inspirou-se assumidamente em Euclides da Cunha para narrar a sua versão da odisséia terrestre de Canudos, as suas condições históricas e suas contradições geográficas. 


          A Canudos e os sertões de Llosa são repletos de fé, instinto e muita imaginação. Trata-se, como no livro de Euclides, de uma Canudos cheia de “fazendas desertas”. O seu cotidiano é feito de micro-narrativas bélicas e de sonhos que passam a fazer parte da carne de quem transita pelo “deserto áspero de mandacaru”. Há nesta Canudos do escritor peruano uma revolução social, e uma entonação meio utópica de quem sonha e possui certezas em torno das ideologias modernas.


          Em seu alentado romance, Llosa relê a alma do sertanejo nordestino, enquanto viaja “... nas trilhas do deserto, entre os cactos e as pedras”[10]. Lendo Llsoa, entendemos que sertão é onde as notícias e os produtos da cultura chegam depois. Sertão é onde a informação caduca. Ou nem vem. Sertão é onde se investiga as derrotas e conta-se os rebanhos e as pedras com o olhar. Ao contrário do pacto feito no Grande Sertão: veredas, de Guimarães Rosa, no livro A Guerra do Fim do Mundo o pacto é dito, assumido. Esse dito é bem arranjado e bom de ouvir nos “desertos onde o vento ululava em redemoinhos”[11].


           Esse “vento” ouvido pelo narrador de Vargas Llosa é o mesmo vento cuja oralidade sedimenta a linguagem poética de Euclides da Cunha. Esse vento perpassa todo o sertão e podo ser ouvido em diferentes paragens do deserto. Na leitura que empreende no ensaio “O Sertão e Os Sertões”, o professor Roberto Ventura, um dos melhores leitores de Euclides da Cunha, refere-se ao autor de Os Sertões retomando a imagem do deserto. Diz Ventura[12]: “(Euclides) recorreu em seus escritos sobre Canudos e Purus, a uma mesma imagem: o deserto. A imagem aproxima a floresta tropical da caatinga do semi-árido, os sertões baianos dos amazônicos. Selva e sertão são vistos como deserto por seu isolamento geográfico e povoamento rarefeito, e sobretudo por serem territórios não explorados pela ciência ...”



BIBLIOGRAFIA


AIRA, Cesar. “A cidade e o campo” in Pequeno Manual de Procedimentos. (orgs.). Chaga, Marco M. e Marquardt, E. Curitiba: Arte & letra, 2007.
BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. 42a ed. São Paulo: Cultrix, 1994.
BRAIT, Beth. (org.). O Sertão e os Sertões. São Paulo: Arte & Ciência, 1998.
BRITO, Ronaldo Correia de. Faca. São Paulo: Cosac Naify, 2009.
CUNHA, Euclides da. Os Sertões. 8 Ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Record, 2006.

FREYRE, Gilberto. Casa-Grande & Senzala. 51ª Ed. São Paulo: Global, 2006.
______ De Menino a Homem. 1ª Ed. São Paulo: Global, 2010.

LISPECTOR, Clarice. A Hora da Estrela. 22a ed. Rio de Janeiro: Frco. Alves, 1993.
LUCCHESI, Marco. Os Olhos do Deserto. Rio de Janeiro: Record, 2000.
MELO NETO, João Cabral de. Obra Completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 2003.
NUNES, Benedito. O Dorso do Tigre. São Paulo: Perspectiva, 1976
RAMOS, Graciliano. Angústia. 32a ed. Rio/São Paulo: Record, 1986.

ROSA, Guimarães. Grande sertão: veredas. 19ª Ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.
TORRES, Antonio. Essa Terra. 21ª Ed. Rio de Janeiro/São Paulo. Record, 2005.
VARGAS Llosa, Mário. A Guerra do Fim do Mundo. Trad. Paulina W. e Ari R. Rio de Janeiro: Objetiva, 2008.




[1] Aira. Pequeno Manual de Procedimentos. 2006. p. 68.
[2] Aira. Pequeno Manual de Procedimentos. 2006. p. 63
[3] Cunha. Os Sertões. 2000. p. 12
[4] Freire. Casa Grande & Senzala. 2006. p. 30
[5] Freire. De Menino a Homem. 2010. p. 36
[6] Versos da canção “Oceano”, de Djavan.
[7] Melo Neto. Obra Completa. 2003. p. 335
[8] Melo Neto. Obra Completa. 2003. p. 335
[9] Lucchesi. Os Olhos do Deserto. 2000. p. 87.
[10] Llosa. A Guerra do Fim do Mundo. 2008. p. 49.
[11] Llosa. A Guerra do Fim do Mundo. 2008. p. 53
[12] Brait. O Sertão e os Sertões. 1998. p. 65.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

São Sebastião de Guido Reni


"... um jovem capitão da Guarda Pretoriana foi acusado e preso por ter adorado um deus proibido. Seu corpo maleável lembrava o de um famoso escravo do Oriente por quem o imperador Adriano se apaixonara, e seu olhar era tal qual o de um conspirador... Era de uma arrogância encantadora. ... A beleza que exibia Sebastião... não estaria destinada à morte?”
.
Yukio Mishima, Confissões de uma Máscara, inspirado no quadro São Sebastião, de Guido Reni

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

o evangelho segundo César Aira II


...todo realismo é oportunista.

Diálogos oblíquos (entrevistas a Bellla Josef)



... a imaginação só pode operar a partir da composição de elementos fornecidos pela realidade ...

 A trombeta de vime



A arte está sempre buscando o novo e o novo acabou se identificando com o diferente.

As noites de flores

sábado, 8 de outubro de 2011

Ana C no Festival do Rio

Dentre os 420 filmes selecionados para o Festival do Rio 2011, destaca-se “Bruta aventura em versos”. Dirigido por Letícia Simões, o documentário possui a vida e a obra da poeta Ana Cristina Cesar como tema, e estréia no cine Odeon na próxima segunda-feira, 10 de Outubro.

domingo, 4 de setembro de 2011

narrativa que se des-dobra


O artista plástico Luciano Figueiredo é designer gráfico, cenógrafo e pintor. Responsável por alguns dos cenários de shows e capas de dicos marcantes da Tropicália, o artista desenvolveu também projetos gráficos  para livros e revistas, como a Navilouca - editada por Torquato Neto e Waly Salomão.

Luciano começou a expor na década de 60 na Bahia. Realizou cerca de 20 exposições individuais, além de pilotar os projetos de preservação da obra de Hélio Oiticia. Sua atual exposição permanece até 07 de outubro no Arte Contemporânea em Botafogo, Rio. 

No belo texto de apresentação do catálago, Felipe Scovino diz: "Espaço-laço é a possibilidade de se executar a partir do mínimo ... uma série de possibilidades e aberturas acerca do lugar da pintura... ... É na sobra da lona que o artista inventa um espaço sobre aquilo que já era dado como concebido. ...  sua narrativa não se esgota, se desdobra."

sábado, 27 de agosto de 2011

Brecht de Aderbal

"É preciso olhar a vida no branco do olho." Essa frase pronunciada por um dos personagens de "Na selva das cidades", de Bertolt Brecht, pontua a peça  que se passa em 1912 na cidade de Chicago.  Com música, cenografia e iluminação certeiras, o drama possui  direção contemporânea e afiada de Aderbal Freire-Filho.


O elenco de "Na selva..." assombra. Daniel Dantas, Maria Luisa Mendonça (impecável) e Milton Filho, dentre outros, lecionam no palco o que é a educação de um ator.Vi algumas das peças mais elogiadas ultimamente aqui no Rio. Nenhuma como esta do autor que dizia não andarem bem juntas a arte e a moral.  Além da qualidade do evento, o preço é ótimo e a temporada vai até 09 de outubro.Vale a pena um novo assombro.


domingo, 10 de outubro de 2010

quarta-feira, 17 de março de 2010

Letras e máquinas na pele

A infância das máquinas e a maturidade das letras



A fixação do progresso por meio de catálogos e aparelhos de televisão. Só a maquinaria. E os transfusores de sangue.

Oswald de Andrade, “Manifesto Antropofágico”



Em parte a gente é arte/ em outra parte, técnica

Antonio Cicero e Marina Lima, “Acende o Crepúsculo”




Sabemos que, desde Aristóteles e sua Poética, arte e técnica têm tudo a ver. Sabemos também que, desde o final do século XIX, a linguagem – principalmente a linguagem literária - começou a ganhar um novo impacto a partir do desenvolvimento tecnológico. Isso foi intensificado durante todo o século XX com a instauração do que chamamos de Modernidade: uma estética que possui no ceticismo e no deslocamento duas de suas principais “senhas”.


A criação de objetos e máquinas como a lâmpada elétrica, o automóvel, o cinematógrafo, o vídeo, a TV e a máquina de escrever transformaram radicalmente os cenários e costumes da vida urbana. Nas cidades, as ações cotidianas – mediadas principalmente pela técnica - passaram a ser mais imediatas, o que de certa forma interferiu no ritmo da produção da escrita e na recepção das artes e culturas.


Também o aparecimento da imprensa diária contribuiu para a mudança de hábitos. Formou um novo tipo de leitor. Um leitor com um outro ritmo de leitura. Desde então, a literatura passou a ter uma forma mais apressada de recepção; e gêneros como o romance, por exemplo, sofreu influência do jornal. A literatura começava a perder a sua aura.

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Uma nova sensibilidade no ar



Difícil não perceber que a entrada de tanta tecnologia em cena contribuiu para a mudança de percepção do sujeito. E a lição do crítico e pensador Walter Benjamin nos ensina que quando muda essa percepção, transformam-se os modos de existência da coletividade e os seus meios de produzir arte e cultura. Cria-se, com essa transformação perceptiva, uma re-leitura do contexto.


Para essa releitura do contexto, gosto muito de lembrar um autor que os jovens alunos adoram: o poeta Paulo Leminski, romancista que publicou em 1975 o denso e injustamente esquecido Catatau. Ele foi professor de História, ensaísta e tradutor de Petrônio, Joyce e Lennon, dentre outros.

Sintonizado com a concretude do seu contexto histórico e estético, Leminski leu Oswald de Andrade, e por isso sabia que a poesia existe na maquinaria e nos fatos. Por causa deles, os fatos, o poeta não perde a sintonia com o contexto, e sabe que não apenas as formas estéticas e culturais são históricas e mutantes, mas até os sentimentos, os nossos gestos... São as mutações identitárias dos filhos da modernidade e suas movências... Leminski leu Karl Marx, é claro. E escreveu um texto belíssimo, como diria minha querida amiga Tetê, chamado "Latim com gosto de vinho tinto".


Voltemos às novas sensibilidades que sedimentam as identidades modernas. Somos testemunhas de que vários fatos contribuíram para a produção de outras linguagens, além das mutações e alterações nos ritmos e tons do texto literário. Dentre esses fatos e mutações mencionamos:
- a leitura do jornal
- a possibilidade de observarmos imagens que se locomovem na tela - do cinema, da TV, do PC
- a transformação do ritmo temporal gerada pelos meios de locomoção
- a criação de uma escrita automática...
Esses são alguns dos fatos e/ou motivos que contribuíram para que o texto literário ganhasse uma outra oralidade e/ou um outro ritmo no início do século XX. Neste início de milênio, esse ritmo torna-se mais radical, a partir do advento da informática, dos roteiros da computação e da escrita virtual. Surge uma oralidade maquínica que gera outras modalidades de escrita.


Nada disso eu soube dizer quando defendi a “letra” contemporânea na Universidade. "Letra" essa sintomaticamente inscrita num Departamento de Tecnologias e Linguagens. Tudo a ver. Uma “letra” do meu tempo. Escrita com as tintas e as trevas do presente. Conteúdos mais voltados para os roteiros das novas tecnologias que se inscrevem, de forma irreversível, em nosso contexto histórico, estético e cultural. Isso porque muito me inquieta a distância que separa a subjetividade maquínica que aciona atualmente o nosso cotidiano, e o quadro de giz do século VXIII com o qual buscamos inscrever o universo de quem nos assiste.


Essa “letra” contemporânea faz-me pensar na palestra que o crítico George Yudice proferiu na UFRJ em 2009. O autor de A conveniência da cultura: usos da cultura na era global iniciou a sua comunicação ressaltando a importância dos professores e pesquisadores atentarmos para o universo dos jovens. Segundo ele, os jovens alunos devem ser inseridos "libidinosamente". Essa inserção tema ver com o fato de que, na sua opinião, "as mudanças culturais não estão relacionadas apenas com a cultura". Essas mudanças têm a ver com a escola e com as políticas educacionais, pois no atual contexto a cultura é lida como "prática material", e não apenas como uma abstração, um bem simbólico.

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Professores gostam?



Segundo Yudice, a maioria dos professores não conhecem (ou não se interessam) pelas práticas culturais dos jovens contemporâneos: video-games, yotube, blogs, chats, MP-3, músicas no pc... Para ele, esse desconhecimento dificulta a interação entre mestres e alunos. Inseridos na atual "cultura do acesso", esses jovens sentem-se desinteressados pelo modelo proposto pela escola.

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Atentando para a importância dos suportes materiais e dos produtos midiáticos da cultura, o ensaísta ressalta "os lugares de socialização da internet". Para tecer relações com o atual contexto digital e midiático, onde novas tecnologias proporcionam o surgimento de outras sensibilidades, o crítico americano resgata a leitura que Walter Benjamin faz do flaneur e do seu trânsito no espaço urbano no século XX.


Segundo ele, a expressão dessas sensibilidades exige outros modos de percepção, outros meios de interação; assim como as formas perceptivas que o pensador alemão conseguiu captar nas primeiras décadas do século XX, principalmente através do cinema e da arquitetura. Principalmente através das Passagens de Paris, suas modas e mercadorias, e da poesia de Baudelaire.


Já ouvi muita gente boa dizer que, se vivo estivesse, Walter Benjamin leria hoje os shoppings... Tudo a ver. Ele sabia que o crítico é um leitor que rumina. Por isso precisa ter vários estômagos, múltiplos olhares...