e todo caminho deu no mar

e todo caminho deu no mar
"lâmpada para os meus pés é a tua palavra"

sábado, 23 de abril de 2011

Letras Contemporâneas




Literatura brasileira contemporânea - Beatriz Rezende e Alcir Pécora - Bloco 4 from IMS - Instituto Moreira Salles on Vimeo.



O debate sobre Literatura Brasileira no IMS envolveu o editor Paulo Roberto Pires, a crítica e professora Beatriz Resende (UFRJ/UNIRIO) e o crítico e professor Alcir Pécora (UNICAMP).

Beatriz responsabiliza os Cursos de Letras pela incompetência do autor, da obra e do leitor. Após o debate no IMS, a autora de “Contemporâneos” (2008) diz que encheu dos autores contemporâneos, e foca nos escritores que “já sossegaram o ego.” Alcir Pécora diz que “literatura não se resolve com atitude”. Ele detona a prosa realista que vigora neste século, escrita em grande parte por autores conformistas que se negam "a pensar seus impasses".

Como leitor, tenho uma antiga preguiça. Preguiça de narrativas e posturas que se tecem de forma egoica e realista. Entre o ego e o realismo, meu coração desanda a bater em outras páginas que são uma beleza. O debate do IMS gerou querelas infindas, como demonstra esta nova matéria do jornal O Globo: http://oglobo.oglobo.com/blogs/prosa/



quarta-feira, 6 de abril de 2011

Las Venas de Galeano

Para Lenita Pinheiro, a primeira leitora de Eduardo Galeano que conheci, linda, uma graça

Texto escrito a partir da arguição da tese de doutorado “Figurações do intelectual latino-americano em Las Venas Abiertas de América Latina”, defendida por Lindinei Rocha Silva na UFRJ, em 2011, tendo a professora Dra Silvia Carcamo como orientadora.

I

Eduardo Galeano é um escritor uruguaio reconhecido internacionalmente como autor do clássico As Veias Abertas da América Latina, publicado em 1971, e de outros livros de tonalidade poética tipo O Livro dos Abraços, de 1989. Com mais de 30 títulos publicados e trânsito pelo jornalismo, o autor é reconhecido também pelo seu testemunho socialista e pelo engajamento político que o levou à prisão e ao exílio durante o período da ditadura militar implantada em vários países da América Latina na década de 1970. Apesar de difícil e radical, essa experiência do autor como exilado foi geradora de formas estéticas e discursos ideológicos. Segundo ele, “o exílio foi a experiência mais importante” de sua vida.


II

Leitor de formação marxista, Galeano filia-se estética e ideologicamente a autores existencialistas como Sartre e Camus. Intelectual engajado que fala em nome do outro, Galeano aposta na oralidade. De ouvido atento ao discurso do outro, às outras vozes que a história não inscreveu, é compreensível que a intertextualidade – o diálogo entre textos – seja o procedimento moderno do qual Galeano lança mão com maior propriedade em Las Venas. A partir do recorte de um cânone literário particular, ele dialoga na produção de intertextos onde ecoam as vozes de autores dos mais diferentes contextos históricos e estéticos como Cervantes, Pablo Neruda, Mario Vargas Lhosa, Graciliano Ramos, Jorge Amado e Darcy Ribeiro, dentre outros. Além de Darcy, três outros "personagens" mineiros aparecem em Las Venas: Tiradentes, Chica da Silva e Aleijadinho.


III

Como forma estética, Las Venas é um obra engendrada a partir do diálogo entre a atividade jornalística e a produção ensaística. Diálogo entre os fatos e os dados referenciais que sedimentam o jornalismo e a “descontinuidade” (Adorno) que caracteriza o ensaio. Las Venas é também uma forma de tom romanesco repleta de personagens míticos e históricos sedimentados em dualidades e paradoxos. Essas formas duais (metrópole/colônia, capitalismo/socialismo, tradição/tempo presente) e os paradoxos servem de base para o projeto da dialética que perpassa todo o século XX como uma das formas de pensar características do intelectual moderno. Essas dualidades e paradoxos se anunciam, antes dos textos, já em alguns títulos poéticos dos capítulos dos ensaios de Las Venas como, por exemplo, “O signo da cruz nas empunhaduras das espadas”.


IV

Eduardo Galeano é um sedutor. Ele deseja seduzir o leitor. Para isso faz, de forma alongada, a “defesa apaixonada de seus temas”, como diz Ángel Rama ao caracterizar a sua escritura. Esse desejo de seduzir o leitor tem a ver também com a necessidade de narrar e repassar o valor da experiência vivida. As viagens de Galeano pela América Latina foram fundamentais para a escritura de Las Venas. Para escrever sobre o continente, ele precisou viver a experiência na pele; o que o aproxima daquele tipo de narrador calcado na oralidade, e sobre o qual escreveu Walter Benjamin no seu belo ensaio “O Narrador”. Esse ensaio é focado na narrativa que possui como base a experiência vivida, gerando uma prosa oral que é repassada do narrador para a sua comunidade. Como o texto de Galeano, o ensaio benjaminiano relaciona o deslocamento e a experiência com a possibilidade de poder narrar e repassar uma norma de vida. Em ambos os autores há um narrador que deseja transmitir uma moral social, um preceito para a existência. No caso de Galeano, é mais do que isso: ele é um intelectual engajado e moderno, típico do século XX. Como grande parte dos autores modernos, ele aposta na totalidade e deseja nada menos que inscrever a identidade de um continente. Como faz em Las Venas.