e todo caminho deu no mar

e todo caminho deu no mar
"lâmpada para os meus pés é a tua palavra"

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

no ritmo da letra e da memória

 
A escritora, tradutora e psicanalista carioca Solange Rebuzzi ostenta uma bibliografia cuja dezena de títulos contempla diferentes gêneros como a poesia, o ensaio e o romance.

Formada em Psicologia, doutora em Literatura, pesquisadora da obra de Fancis Ponge, ela coordenou o Seminário de Literatura e Psicanálise, na Escola Letra Freudiana do Rio de Janeiro.

Autora de textos ensaísticos sobre alguns escritores seminais da nossa literatura, como João Cabral e Paulo Leminski, ela lança no próximo dia 28 o Livro das Areia. Sobre esta narrativa de 2012, outros livros e temas do seu inverso profissional, ela fala a seguir.

 

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1 - Solange, como classifica o seu novo livro de ficção, cuja “língua que não é só a de um romance”?
 
O Livro das areias é uma narrativa. Está fora das classificações mais usuais. Nasceu assim. A escrita deu a direção à minha fala, fora da linguagem mais linear. Quando afirmo, no início do livro, que a língua não é só a de um romance quero marcar essa diferença, enquanto possibilidade. Ele está escrito em versos livres, mas é uma narrativa de tempos vívidos em diálogo com a escrita.
 
 
2 - A sua inscrição profissional abrange diversas áreas do saber e da cultura como a psicanálise, a literatura e a tradução. Até que ponto a psicanalista, a escritora e a tradutora dialogam? Ou estas atividades profissionais são exercidas de formas isoladas?

 
Nonato, meu caro, são as diferentes áreas de “um saber não sabido” que se mostram como eu gosto de dizer. A psicanalista, a escritora e a tradutora conversam... O meu interesse está assinalado no estilo que as narrativas, as distintas narrativas, saboreiam. O escrever se impõe a partir da leitura com o ritmo da letra. Os gêneros importam menos.

No consultório, são os analisantes quem fazem e refazem sua própria escrita-vida diante de uma escuta analítica que lhes dá novas possibilidades.
 
Na tradução o trabalho celebra a língua estrangeira, que nos alcança enquanto tradutores-escritores-poetas e a experiência se coloca diante da falta, pois não se traduz nunca com a completude e a perfeição. Traduzimos com o desejo e a capacidade de inventar, subtrair e/ou somar.

 
3 - Quais são as diferenças entre este Livro das Areias (2012) e as narrativas de Estrangeira (2010) e Quase sem palavras (2011)?
 
 
 O livro Quase sem palavras foi escrito primeiro, no final da década de 90. E é um romance; um romance poético. Tem personagens, uma história que avança durante algumas décadas, uma temática, etc... Os fios que tecem essa história“quase sem palavras” dizem algo da ditadura, dos exílios, da busca amorosa da juventude na cidade do Rio de Janeiro de outras décadas, com seus bares, praias, encontros e desencontros.

Estrangeira nasceu depois de um tempo de estudos na França, durante um doutorado-sanduíche em 2005. É também uma declaração de amor à Paris, mas não só. Talvez, por isso ele tenha sido publicado primeiro. E o Livro das areias cresceu aos poucos, obedecendo ao ritmo da memória, pois é bastante autobiográfico (dentro da lógica que reconhece que o escrito carrega o bio da grafia ficcional sempre, conforme nos ensina Roger Laporte).
 
 

sábado, 17 de novembro de 2012

Chico lê Aderaldo

 
 o compositor e secretário de cultura da PB e a História Crítica do Cordel Brasileiro
 
 
 
 

Cordel não é folclore


Como diz na entrevista a seguir, o professor e poeta Aderaldo Luciano, autor de O auto de Zé Limeira (2008), vem pesquisando o cordel há 20 anos. Em 2007, ele defendeu na UFRJ a tese de doutorado “Literatura de Cordel: visão e revisão”, orientada pela professora e escritora Helena Parente Cunha.

Desde então, o autor vem ministrando aulas e apresentações públicas onde apresenta uma “narrativa” entremeada de figurações da cultura sertaneja e cenas urbanas, com uma metodologia repleta de informação e humor, na tradição da aula-espetáculo de Ariano Suassuna.

Seguindo a trilha aberta por M Cavalcanti Proença que lê os aspectos literários do cordel, a pesquisa de Aderaldo elege a linguagem como um dos principais “personagens” desta literatura. Ele traça uma espécie de recepção crítica desta forma literária, e critica a maioria dos estudiosos e pesquisadores da historiografia do cordel.

Esta crítica tem como base os aspectos folclóricos e culturais dos antigos estudos e pesquisas, em detrimento dos elementos literários que esta pesquisa busca priorizar. A seguir, a fala deste leitor de Câmara Cascudo e Augusto dos Anjos, que traz para o campo da linguagem a especificidade do cordel, e acredita no seu “caráter literário”.
 

1 - Aderaldo, por que o cordel em pleno século XXI?

O cordel é a única forma poética genuinamente brasileira. Todas as escolas literárias passaram e o cordel continua. É como o soneto: não tem idade e é sempre vanguarda. Infelizmente nunca recebeu o tratamento merecido. Com os deslocamentos do eixo cultural e as mudanças sociais vigentes neste século, o olhar sobre o cordel também migrará. Há 20 anos venho me preparando para isso. Agora é hora.

2 - Quais são os autores mais representativos do cordel no Brasil?

Da Geração Princesa, a pioneira, temos Leandro Gomes de Barros, Silvino Pirauá de Lima, João Martins de Athayde e Francisco das Chagas Batista. Da Geração Prometida, a intermediária, que ofereceu permanência ao cordel: José Camelo de Melo Resende, Delarme Monteiro, José Pacheco, Antonio Teodoro dos Santos e Manoel D'Almeida Filho. Da Geração Coroada: João Firmino Cabral, Bule-Bule, Manoel Monteiro, Antonio Américo de Medeiros e Azulão. A Geração Celebrante, esta que aí está segurando o bastão e fazendo fé na coroa, aprendeu com os mestres e está trilhando o bom caminho, mas ainda está sob observação.
 
3 - O que diferencia este seu novo livro da História do Cordel Brasileiro de 2011?

 No título do meu livro está escrita a palavra "Crítica". Isso é o diferencial: pela primeira vez fazemos a crítica de tudo que foi dito e anotado sobre o cordel e refutamos a maioria das informações, por exemplo: o cordel brasileiro não é o mesmo cordel de Portugal, há apenas uma ligação em sua forma física e em alguns temas, mas temos uma autonomia poética decisiva; o cordel não é o aspecto escrito da poesia oral dos cantadores repentistas. Dialoga, mas se afasta; o cordel não é uma poesia dita sertaneja: é um misto de ruralidade e urbanidade. Embora alguns autores venham do sertão, é no brejo e nas cidades onde ele se consolida; O cordel não é folclore: tem data e autoria; as xilogravuras que ilustram algumas capas de folhetos não são sinônimo de cordel. São um acidente de percurso. A maioria dos cordéis não são ilustrados com xilogravura. É um "mito" que engravidou vários "estudiosos".

 É isso, caboclo.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

FLIPIPA 2012


 
No link abaixo, encontra-se a programação do quarto Festival Literário da Pipa que acontecerá este ano de 22 a 24 de Novembro no RN. Evento literário que se identifica com o discurso multicultural contemporâneo, o FLIPIPA celebra a literatura e a leitura, e  conta com a participação de escritores, poetas, professores, jornalistas, pesquisadores acadêmicos e críticos literários, objetivando, segundo o site do evento,  "unir as duas pontas da prática literária: o pensamento crítico/acadêmico e a formação através de uma programação educativa".

http://www.flipipa.org/

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Obama bis



o discurso multicultural do presidente negro
reeleito com cabelos brancos
pelas minorias ora maioria

na sintonia virtual a semelhança dança

o riso solidário via twitter:
negros mulheres gays
pobres e jovens
alunos de Harvard

71 % dos latinos apostaram na sensibilidade social dos democratas americanos
 
isso faz o mundo respirar um pouquinho
melhor, mais lépido
menos bélico

 

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Obama

 
 
Filho de um economista com uma antropóloga, ele foi criado entre livros, filmes e peças de teatro. Como sua mãe, ele é fã do "Orféu Negro" - um filme dirigido pelo francês Marcel Camus, baseado na peça "Orféu da Conceição", de Vinícius de Moraes.

Obama foi professor. Estudou Direito e Ciências Sociais em Harvard e Columbia.  Deseja menos dores, menos narrativas bélicas na internet e nas bibliotecas da América. Tem sorriso firme e humor suficiente para comparar-se ao vira latas que procurava para a filha em 2008, quando assumiu o cargo como primeiro presidente negro dos Estados Unidos.

Aos 52 anos, a biografia deste Nobel da Paz ostenta uma vida em trânsito. Viveu na Indonésia e no Havaí. Viu, pegou e tirou ondas. Muitas ondas. Ouvido treinado por Males Davis, Bruce Springsteen e U2, o presidente assume que tragou. Negro lépido e afirmativo, sua imagem  aciona o exercício da diferença e aponta para um roteiro histórico e cultural bem mais solidário. Isso pode aferido em assertivas tipo "Eu adoro esse cara", referindo-se ao ex-presidente Lula em 2009.

Ao contrário de republicanos como Bush e Romney, o democrata autor de "A origem dos meus sonhos" vê além das diferenças raciais na América em crise: "não há um EUA branco e outro negro, e sim os Estados Unidos da América". Por isso ele diz ser o presidente de todos os americanos. Em português, seu nome remete à conjugação do verbo amar no presente do indicativo e no imperativo: ama.
 
Como escreveu hoje Arnaldo Jabor nO Globo, "se o Mitt for eleito, voltará a grande máquina careta onde todos se encaixam como parafusos obedientes, uma máquina que paraliza o presente num passado eterno..."

Obama bis.

 

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

ajoelha



...  a morte que é nesta história o meu personagem predileto.

Clarice Lispector, A Hora da Estrela, 1977

 

... com o rigor/que a morte pede 

Armando Freitas Filho, Cabeça de Homem, 1991

 

...digam-lhe
a verdade, que esta tão
dura morte é ainda o
resto da minha alegria

Walter Hugo Mãe, Poemas, 2005


  
Eu estive com a morte de frente; vou ter medo de encarar o que?
 
Reinaldo Gianecchini em “Marília Gabriela entrevista”, 2012



... quando não escrevo estou morta...

Clarice Lispector, entrevista para a TV Cultura, 1977