e todo caminho deu no mar

e todo caminho deu no mar
"lâmpada para os meus pés é a tua palavra"

domingo, 27 de setembro de 2015

Gonaçalo Tavares

 

Uma viagem à índia: melancolia contemporânea (um itinerário)
 
Para o poeta João Batista de Moraes
 

Com alguma sombra de Pessoa – maior ainda a
de Whitman – mas sem lágrimas recalcadas.

Eduardo Lourenço, Uma viagem no coração do caos
 

... a biografia de um país
passa também pela gastronomia profunda: o que é um povo
senão o que come?

Um estrangeiro é sempre uma novidade, tanto verbal
como no número de hábitos que traz para a paisagem.

Um homem que fale demasiado/ é surdo

Foi noite e choveu, agora está sol e amanhece.

O que é um dia senão um jogo de dados/ entre vontade e matéria?

Um homem apaixonado é um excesso/ de concentração

Paris tem uma paisagem propensa à memória; / cada cidade privilegia certas áreas do cérebro...

E sabendo-se que os sonhos misturam vários estilos literários – p. 186

Em sítios de calor os abraços de conforto/ não são assim tão importantes – p. 187

Como alguém que acelera para não ver o mundo – p. 195

Só ouço quem me diz Avança,/ eis a minha surdez... – p. 1999

Porque nem em Paris é sempre Dezembro,/ nem no Brasil a rotação pára sempre no mês quente. – p. 204

... percebendo então o que falta/ aos mapas: o cheiro – p. 205

No centro de tua queda/ se erguerá a tua tranquilidade... p. 208

O rosto/ é manuscrito pelo punho dos inimigos/ – e esta é a primeira parte da primeira aprendizagem - p. 215

Os cães não tiveram/ os Gregos como antepassados – p. 218

... mas até as doenças/ querem ser contemporâneas – p. 233

A luz do sol – é bom relembrar o óbvio –,
não está no mundo para prestar bons serviços à literatura. p. 235

O poder é inimigo dos versos, eis o facto. p. 239

Ninguém mente aos gritos, de longe. p. 243

de longe, a maior invenção dos Homens/ é o beijo – p. 253

Cada morte diz qual o bocado do corpo/ que afinal deverias ter defendido – p. 270

Ninguém varre o que ama, e a natureza está a varrer/ a cidade – p. 274

No meio dos piores momentos prepara-se o/ dia de sol e o cheiro mínimo das ervas verdes – p. 276

Os caminhos aumentam/ quando a cama é má – p. 298

O Ganges é a biografia,/ em líquido, de todas as cidades próximas – p. 298

Bloom sabia que só existe idade madura no corpo que/ atravessou uma doença ou a compreendeu – p. 308

Um insulto/ ou uma leve indelicadeza sintática/ podem estragar um/ dia biológico e compacto – p. 313

No azul deveremos enterrar a nossa estaca – p. 314

Vento tão lento que parede um provérbio – p. 382

No ócio o rosto desembaraça-se e sozinho ganha/ um estilo individual; portanto: perigoso – p. 388

Como a imobilidade e a atenção são sinônimos! p. 408

 Uma estrada é interrompida/ por uma maçã perfeita – p. 412

No Ocidente o divino foi paginado cuidadosamente; / tem uma encadernação cara – p. 414

 
 

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Clarice vai à Feira



I Conferência de Saberes e Tradições Nordestinas
Local: Rio de Janeiro, Centro Luiz Gonzaga - Feira de São Cristóvão,17 a 20 de Setembro


Dia 17 - 09 - Local: Biblioteca Padre Cícero
14H às 15:30H – Histórias da Feira de São Cristovão - Patrimônio Cultural Imaterial

Elis Regina Barbosa Angelo – UFRRJ: Âmbitos do patrimônio imaterial: conceitos, definições e direções na construção dos saberes do Brasil.

Prof. Nonato Gurgel – UFRRJ: Clarice Lispector na Feira de são Cristóvão.

Prof. Leonardo Santana da Silva - Unisuam – (mediador)

sábado, 12 de setembro de 2015

Maria Bethânia

 
Para Macabéa Córdova que viu comigo
 

Amanhã é o último dia da mostra que comemora, no Paço Imperial, os 50 anos de carreira da deusa baiana. Ouvi Fernando Pessoa na voz de Maria Bethânia antes de ler o poeta luso na página (O eu profundo e os outros eus). Isso não é pouco. Marca um jeito de ler a poesia e interpretar o mundo. Um modo meio carta e carcará - pega, mata e come - de ouvir e estar no mundo. Modos que a grande artista Bia Lessa traduz com vigor na direção da mostra que poderia se chamar O cheiro da canção.
 
Hoje cheirei e ouvi literalmente a voz que Deus deu para ela cuidar. A voz que sai de antes do umbigo. Voz que acolhe e corta. Uma enchente que seca e depois sangra. Canto que confirma e inventa uma vida, como diz a escritora portuguesa Inês Pedrosa nas paredes - as paredes sabem tudo, por isso um homem pode amar uma parede, uma pedra, uma planta. Mesmo que esta planta seja capim, como Macabéa. Capim de feno. Inês sobre Bethânia: "Pessoa escreve na tua voz o vendaval de paixão que seu corpo apenas pode inventar..."
 
Assim é a mostra e suas mais de mil peças: telas, esculturas, fotos, vídeos, objetos pessoais e canções. O feno - o cheiro - perpassa os ambientes. Feno/floração. O expectador é seguido pelo cheiro do feno que floresce pelas salas. Além do capim verde marrom, outros cheiros acionam o corpo que ouve as vozes das lavadeiras. Haja memórias. Memorial afetivo do pretérito. Melhor focar no presente da mostra. Focar no fundo. O fundo verde das paredes que, inscritas a fogo e giz, falam.

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

mortos nas praias

 
 A escritora senegalesa Fatou Diome
e os impasses da velha Europa ou
a leitura histórica perturba o gozo estético


sábado, 5 de setembro de 2015