e todo caminho deu no mar

e todo caminho deu no mar
"lâmpada para os meus pés é a tua palavra"

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

ciclo canino

Sem cais nem canil, encara com fé a sombra de antigos espelhos que carrega nos ombros. Lembra o cachorro que é um rio cujas águas amolecem ossos e pedras. Seus cheiros e rosnados agasalham quando o contexto pede silêncio viril.

Para viver este ciclo canino, desenvolvo uma metodologia animal. Uso líquidos de uma mulher que me amou e fez do meu corpo obra de arte. Foi ela quem nomeou o canil que trago no peito. Antes dela, provei chás de uma moça que enxugava dorso de montanha em dia de chuva.

Agora, nutro-me de Clarice Lispector e seus animais. Clarice é bicho corajoso. Confessa que certa vez apaixonou-se, de cara, por Dilermando – um cachorro com cara de brasileiro encontrado numa rua da Itália. Resultado: pagou (isso: pagou) e levou o cão para casa. Rolou a partir daí uma narrativa de cheiros, comidas, abanos, gestos obscenos e, claro, beijos disfarçados. As visitas – coitadas – ficavam passadas.

Segundo Clarice, cachorro cheira as coisas para compreendê-las. Diz ela que eles não raciocinam muito, mas são guiados pelo amor dos outros e deles mesmos. Clarice é a autora brasileira que mais entende de bichos. Em sua obra eles constituem uma simbologia do ser. Por isso ela saca no cão um bicho misterioso que sente tudo, menos a noção do futuro.

Na sua escrita, cachorro tem fome de gente. Tem desejo. Aprendi com Clarice e TT que, às vezes, para abanar o humano é preciso contatar nos lábios o Cão que te deseja. Principalmente quando você e esse Cão usam os mesmos remédios
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3 comentários:

Anônimo disse...

amo texto canino com este

bjs
LLL

Eduardo Lima disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Eduardo Lima disse...
Este comentário foi removido pelo autor.