e todo caminho deu no mar

e todo caminho deu no mar
"lâmpada para os meus pés é a tua palavra"

terça-feira, 15 de maio de 2012

leituras da paisagem



Algumas paisagens nordestinas serviram de cenários para o leitor em formação que eu era no início dos anos 80. Amo cenários de leituras à beira mar como Caucaia e Canoa Quebrada (CE), Alcântara (MA), Jacumã (PB), Trancoso (BA) Pitangui, Baía Formosa e Pipa (RN).

Essas praias são rotas de muitas tribos. Principalmente para mochileiros, estudantes e alternativos do mundo inteiro. Viajam por elas surfistas e leitores paridos pelos movimentos da contracultura. Últimos “hóspedes da utopia” andando sozinhos ou em bandos. Muitos deles tendo como parceria um livro ou "caderno terapêutico".

Algumas leituras daquele contexto ainda ecoam. Lembro da poesia de Pessoa e do romance “Não verás país nenhum”, do Ignácio de Loyola Brandão, lidos em Canoa. De Alcântara - onde li o mar mais triste que olhei - ficaram os casarões em ruínas a espera do imperador, e um São Raimundo Nonato de madeira que ainda hoje me fita das estantes que me suportam.



leitura formata a alma



Lendo o “Livro do Desassossego”, do Bernardo Soares, em Pipa, atravessei por entre pedras o deserto das águas; fabriquei sustos, até então desconhecidos, perante a pujança com a qual a vida às vezes brota.


“Ópio”, do Jean Cocteau, foi lido em Trancoso em meio aos excessos da juventude e o martírio da beleza.


Uma dissertação sobre a poesia da escritora Ana Cristina Cesar foi escrita na praia de Pitangui - um retiro prolongado cujo silêncio vicia. De Jacumã, ficaram leituras esquecidas e as passagens das águas claras de rio e mar avisando que a vida flui.




Trindade

 


Lembrei dessas paradas de águas e letras porque li - em Trindade (RJ) - “O filho de mil homens” do Valter Hugo Mãe, e “Alguma Crítica” (que título) do João Alexandre Barbosa - grande crítico literário e professor, com quem li a modernidade crítica de Drummond e Cabral.


Na segunda vez que estive neste destrito de Paraty, li "Portugal como destino", do Eduardo Lourenço, e a poesia completa de Alberto Caeiro (ouvindo "O rio da minha aldeia" musicado por Tom Jobim - "A música em Pessoa"). Completam o concerto, as "Vozes da lírica hispano-americana" na tradução precisa do mestre Aurélio Buarque de Hollanda.


Trindade (foto) é um cenário para sempre. Um cenário de leituras que, assim como aquelas praias nordestinas, devolve o leitor a si. Nestas paisagens marítimas, quem lê se reconhece - à la Bernardo Soares - como sinfonia.

5 comentários:

ANNA disse...

Olá Nonato!Primeiro,novamente obrigada pelo lindo dia das mães que me deu!
Canoa Quebrada,Trancoso,Pipa,Fernando Pessoa,Jack kerouac,Dorival Cayme e meus vinte anos...
Realmente,saudade não mata!
Bjs,Anna Kaum.

Nonato Gurgel disse...

Anna, tb estou com saudade dos 20 anos

bjs

ANNA disse...

Pela foto do perfil,não estás tão distante assim dos vinte,mas,de qualquer jeito,é uma época mágica.
Estou aguardando sua visita,Nonato,ia adorar seu carinho e seu olho clínico nos meus rabiscos.
Bjs,Anna Kaum.

Anônimo disse...

Amo estas paisagens com saudades dos anos oitenta. Como eram lindos e bregas os anos oitenta.

bjs

LH

Nonato Gurgel disse...

LH, concordo que aqueles anos eram mesmo lindos, bregas e cheios de viagens

bj