e todo caminho deu no mar

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"lâmpada para os meus pés é a tua palavra"

domingo, 22 de dezembro de 2013

Hilda, que seja


Para Ilza Matias

 
Hilda releu na modernidade – desde meados do século XX até a sua morte em 2004 –, a angústia do infinito que acomete principalmente os autores românticos. A releitura desta “obscena senhora” H parece acelerar, na veia de quem lê, o sangue que escorre acendendo sombras.  Sangue veloz na direção do infinito. Embora sua literatura possa atentar tanto para o ser que ama ou enlouquece, como para um sapo que gostaria de tomar banho de sol pelo cu, é o infinito que Hilda traz no peito.

 
Esse peito que transita da terra ao infinito produz um texto cuja voltagem de erotismo e tensão é alta. Hilda é alta tensão. Assim como Clarice Lispector e Ana C, ela fabrica uma escrita do desejo que possui na sintonia com a diferença do outro – o pai, o mestre, a paixão – o seu alvo. Sob as bênçãos de Lilith, essa trindade seduz. Escreve com o corpo. Muda o tom do discurso feminino na literatura brasileira, ao estetizar uma linguagem da paixão que não descarta o grotesco em comunhão com o sublime, o efêmero, o sagrado.

 
Tendo na compaixão e na liberdade do ser o seu jeito de existir, essa estetização detona o excesso de gráficos e tecnologias que automatizam os modernos. Como lidar com sentimentos como a compaixão e a liberdade, num tempo no qual a violência e a deselegância ditam condutas? Essas indagações procuram entender o "exílio" da escritora que foge da cena literária urbana, nos anos sessenta, para a solidão da sua “torre de capim”, no interior de Campinas. Foi lá que ela pariu mais de trinta títulos nos principais gêneros: lírico, narrativo e dramático.

 
Uma obra intensa, como registram os estados febris e experimentaias do corpo que a inscreve. O mesmo corpo que vomitou, no internato, ao ler a vida de Santa Margarida. Corpo que viveria depois grandes paixões. Leu as fomes e febres do mundo e de si. Viu discos voares.  Dialogou com árvores. Recebeu recados esotéricos. Ouviu e gravou vozes do além. Hilda produziu uma literatura utópica ao ler, nas so(m)bras do contexto (e do próprio texto), as “pequenas epifanias” dos mundos que ela estetiza. Utopia que consiste em “fazer da tua linguagem uma extensão da tua própria atuação”. Hilda disse e fez.
 
 
 

3 comentários:

Mariana Belize disse...

lindo demais o texto.

Nonato Gurgel disse...

Valeu, Mariana, bom ano novo. bj

Leilane Mendes disse...

Adorei o texto! Tenho que ler "esta “obscena senhora” H"...
Abraços